23/07/2007

marcas do trágico

"A minha renuncia, enche minh'alma e o coração de tédio. A tua renuncia, dá-me um desgosto que não tem remédio. Amar é viver, é um doce prazer, embriagador e vulgar. Difícil no amor, é saber renunciar!"(Roberto Martins e Mário Rossi)

Amor... palavra utilizada amplamente para tentar significar laço, vínculo. Infelizmente, tão utilizada para se referir a tantos sentimentos diferentes que até se banalizou. A importância do amor nas relações é algo recente.
Tudo começou por volta do século XII, quando os poetas cantavam o amor proibido à mulher amada. O alvo de amor do poeta era uma mulher casada, nobre, linda e totalmente fora de alcance. Os respectivos maridos não se sentiam ameaçados com as declarações públicas. O que sustentava o casamento nada tinha a ver com essa coisa chamada Amor. Isso era coisa de poeta.
Mas como tudo que é efetivo em qualquer história, a corrosão do amor, dentro da instituição família, foi acontecendo lentamente... Esse sentimento passou a ser considerado fundamental no Romantismo, lá pelo século XVIII. Mas os românticos ainda carregavam a herança do amor trágico onde o objeto de amor continuava sendo proibido, sendo este o elemento de base nas construções poéticas. O amor tinha que ser intenso, violento e trágico.
Apesar de sermos filhotes do Romantismo, vivemos num período Pós Moderno e temos demandas diferenciadas do século XVIII. Tanto o homem quanto a mulher precisam caminhar com as próprias pernas... A dama já não deve ficar esperando no alto da torre seu caveleiro dourado. Já não é possível sustentar o equivalente trágico do romantismo. Chega o tempo do amor a ser construído em sua possibilidade de existência. A mulher não é proibida porque existe o divórcio. Aparentemente o mundo ficou mais simples, descrito assim. No entanto, a herança do trágico permeia a construção subjetiva dos amantes onde o sacrifício continua tendo um lugar dentro das relações. Sacrifício e flexibilidade geralmente ainda não se diferenciam tão fácil.
O amor não é vulgar, ele traz vivências efêmeras com uma possibilidade de registro sublime, dentro de uma construção permanente. Em poucas palavras, Calligaris descreveu o amor entre homem e mulher na expressão "é quase impossível ficar sem você", muito diferente do apego que poderia ser formulado como "preciso Ter você". A ausência do objeto amado gera uma dor muito específica no amante.
Então, sem pretenção de dissecar o trecho poético descrito acima, nessa versão parece que o amor deve conter renúncia, sendo esta sinônimo de "tédio e desgosto". Que amor tedioso e desgostoso é esse? Será que é amor? Essa descrição mais se assemelha à falta de amor que com a presença dele.
Sob o risco de distorção da poesia, peço perdão aos poetas... mas os tempos mudaram

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